Nos reflexos na janela esborratada pelas mãos da criança perdida
Revelou-se o desenho da tua memória nunca antes invocada
Quem és? O regresso adiado das coisas imaginadas e feitas jamais
Quem foste? Os sonhos inatingidos e castrados à nascença pelos próprios pais
Quando te deitas em que pensas? Na tua vida na que imaginas e na que tens.
Nas promessas de um caminho pelo qual afinal não vens?
Despido de todas as aberrações e capas.
Ser simplesmente como se é
Um chá. Numa terrina de sopa. Percebes a ironia? Estarei louca?
Seria a mesma ao acordar? Preferias café?
No teu olhar vejo o mar. A saudade das causas vencidas e das horas mal passadas.
As tuas ondas são mais salgadas. Trazem a maresia e os ares da montanha.
Que completa e encaixa na planície da erosão
Evocando um mundo maior onde o criador foi peremptório
Em separar as águas com avidez tamanha
Que a bebeu toda e no seu lugar deixou o céu.
E o teu sorriso de menino perdido que esborrata desenhos no vidro partido
Corta-me em perfeitos cacos e deixa-me novamente de braço caído
E totalmente atenta aos sinais
Aquele trilho que cobiço. É também por aí que vais?
Ao fundo dos precipícios altos
Ao preto negro dos basaltos
À seiva das ervas claras cheias de viço
Ao calor do beijo anunciado
Que antes de mim
Será roubado por uma das tuas servas
Que resmunga e te excomunga entre os dentes
E te encomenda a morte a gigantes valentes?
Seria mesmo assim?
Apesar do final do trilho ser sempre incerto
A minha testa de menina perdida que corta os pulsos na pedra partida
Poderia parar no percurso e descansar no teu peito aberto
E no final o teu corpo marcado pelas silvas encostar-se-ia à minha garganta?
Se tu fosses demónio ancião, eu seria uma nova santa
E o salitre das arribas ficaria contrabalançado
P’ la humidade relativa das nossas almas em colisão.
MM’ 12 Março 2012