Tentava segurar o cigarro entre dentes, inspirava o fumo e deixava que se soltasse
Dilatando as narinas, escrevia num teclado apagado, assim como se apagam pedaços de vida , mal se vêem mas estão lá, adivinha-se o sítio.
O fumo ardia-lhe nos olhos, lacrimejava e não tinha mão que lhe secasse a face .
Ocupava os dedos dedilhando um teclado que se esbatia de uso, a cinza caí-lhe em cima do peito, agora não podia parar, nunca mais poderia parar.
Os olhos ardiam, e não viam mais nada para além das sumidas letras de um teclado usado, tão usado quanto ela.
Tinha-o usado na vida, gastava-lhe o tempo
Usava-se, a si mesma, para tentar reescrever vida.
Escrevia-a em pedacinhos, pequenas frases, letras escondidas em palavras demasiado rebuscadas.
Era nessas alturas que pensava que a vida não se podia voltar a pintar, a tinta caía com o tempo, por si só. Remenda-se ali, pincelava-se acolá.
Imperfeita
Em paredes gastas, teclas usadas e pinturas maltratadas, a vida corria plana , sem círculos.
O fumo amarelecia as paredes da sala, a cinza caía-lhe em cima
no meio de nada
fazia-se em pó
e
não a preocupava.
Teresa Maria Queiroz
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