quinta-feira, 11 de agosto de 2011

pés presos aos pés da mesa (parcas palavras 2)

Ouviu uma frase que enche o estômago até ao vómito, duzentas palavras, lâminas disfarçadas, que rasgam a pele e bloqueiam a carótida.

Há dores agudas que sobrepõem as outras, as graves, pena termos que as prolongar até à exaustão. Arrancou os cabelos com uma pinça de alma, um a um, à janela, para os ver cair, para os deixar pousar, para que cada longo cabelo salgado-morto, ainda com o teu nome, volte a crescer insosso, incógnito, ignoto.

“Hoje durmo no chão, entre o frigorífico e o fogão (sem coragem para acender o gás). Quero voltar a andar direita, porque o colchão da cama curvou-me as costas com o teu cheiro.”

Apenas porque disseste (B de besta):

“Não quero contaminar mais os teus lençóis.”

in “talões multibanco e supermercado, 2006”

Quase uma carta....







Olá :-)


Por vezes as letras não formam as palavras que queremos ou melhor, que devemos, pois é clássico o eterno conflito entre o Querer e Dever.



Por vezes a atracção reside nas diferenças: desejo / romance; vontade / dúvida; breve gostar / paixão; aventura / descoberta; ou simplesmente nos complementos (in)directos deste jogo de sedução em que nos inventamos...Vá-se lá saber porquê...Talvez porque ando sem rumo, porque medito demasiado, porque tento esquecer um desgosto, porque me perco e encontro nesse olhar cheio de promessas que jamais cumprirás, porque o teu colo tem sabor a paz, porque estou ávida de ternura, porque...



...Mas tento não cair na armadilha da qual sei de cor, o sabor triste de despedidas adiadas...


Até porque não sei viver de outra maneira: apaixonadamente um dia de cada vez, intensamente como se fosse o último, sem sustos, nem medos, a uma velocidade alucinante...



Por isso e por tantas outras coisas que, de se saberem se banalizam se as escrever, tento fugir neste paradoxo de só vou porque estou apaixonada e não quero apaixonar-me, assim não vou...



Percebes agora porque parece o meu discurso incoerente? Porque digo uma coisa com a boca, dizendo outra com o olhar? Porque não pareço convincente?



Não tem nada a ver com moral, pecado, sentimento de culpa...É uma defesa, a melhor que consigo para que não nos magoemos...



Claro que ainda sinto a magia de momentos especiais...claro que me atrais, claro que me apeteces. Mas talvez seja tempo de fazer o tal exercício de disciplina que sempre desprezei, eu que há pouco tempo descobri / aprendi que devemos seguir o coração...




Não sei do que preciso...


Talvez de um tempo de solidão para que me encontre, talvez de um amigo que permaneça sem esperar nada em troca, talvez do teu olhar quente em dias cinzentos de nevoeiro...



...Se soubesses as saudades que sinto, sem teres partido, se soubesses a falta que me fazes, mesmo quando estás...



Um beijo e muito de mim.


quarta-feira, 10 de agosto de 2011

pés presos aos pés da mesa (parcas palavras 1)

Quando o Bruno acordou Maria estava a sorrir genuinamente. Tinha numa mão dois copos e na outra um garrafa.

"- Para que é isso?"

"- Quero que passes um bom dia. Este dia é especial para ti, e quero-te feliz, mesmo que não seja na minha companhia."

"- mas..."

"- Aceita antes que o arrependimento..."

"- Obrigado."

O dia seria passado com o passado. Dói, numa dor fina, como um corte de uma folha de papel por entre os dedos, mas preferia sentir a dor do que contrariar uma vontade, mesmo que isso implicasse nunca mais o ver.

Já dias antes mediante.

"-Este livro é o preferido dela, nunca o li."

"-Gostavas de o ler"

"-Sim"

Ofereceu-o com uma dedicatória de quem o quer ao seu lado, mas que o corpo presente parece marcar ainda mais a sua ausência.

Nunca mais o viu, ou o Bruno entrou na fantasia do livro ou se afogou no vinho dentro de um dos copos.

in "guardanapo de papel numa esplanada, 2004"

Era verão nos nossos corações
E noite nas terras distantes.
Era a escuridão, como um presságio,
Que descia sobre as palavras
E, morbidamente, dissecava o silêncio.
Já não tenho forças
Para pousar a minha mão sobre a tua
E levar-te a passear naqueles fins de tarde
Nos jardins de fogo suspensos.
Já não tenho forças para partir
Para o país onde ardem tempestades,
Onde todas as crianças sonâmbulas
Vêm adormecer nos meus braços.
Era verão nos nossos corações.
A noite desce sobre mim.
Sou este corpo, quase sem existir,
Atravessado pelo vento.

Paulo Eduardo Campos, In “Na Serenidade dos Rios que Enlouquecem”.
Ed. Amores Perfeitos, 2005

terça-feira, 9 de agosto de 2011


Como se começa um postal destes, quando o que tenho para vos transmitir, não são boas noticias…
Adoraria não ter de partilhar o mesmo espaço com vocês, digo mais, seria um prazer tirar férias de vocês, melhor ainda, nunca mais vos ver, isso sim seria perfeito!
Odeio tudo o que vocês representam, turistas oportunistas é o que são.
Com que direito e autorização chegaram e decidiram passar férias no meu espaço preferido?!
E o pior é que ocuparam o espaço todo, não estará na altura de deixarem de ser egoístas e irem para vossas casas?
Este espaço nunca foi, não é, nem nunca será o vosso!

Vão embora!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Para além de estranhos, são porcos, mesquinhos e sem educação…são desprezíveis!
Deixam vestígios por onde passam, impossível não vos ver ou sentir, são repugnantes.
E o mais surreal é que têm o discernimento de ainda trazerem amigos, como se ainda existisse espaço.

Vão embora!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Este espaço não estava à venda, nem para arrendar, muito menos para ser ocupado dessa forma abrupta.
Silenciosamente entraram, instalaram-se, fizeram uma festa, convidaram um monte de amigos e vão ficando como se fossem donos e senhores do espaço.
Mas este espaço não é vosso, é meu!!!!!!

Vão embora!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

O que vos quero transmitir é que, a bem ou a mal, vocês terão de sair.
Usucapião?
Sim terei isso em conta, infelizmente não posso infringir a lei, bem sei, por isso, estas serão as minhas ultimas palavras:
- próteses e artroses, podem ficar, divirtam-se o corpo é vosso;
- doença rara, também vais ficar, mas vais ficar quieta, pois eu já te sei controlar;
- anemia não te esqueças, tens um mês para saíres;
- quanto a ti, coisa esquisita, sem nome, mas ruim, que ninguém sabe quem és, fica a saber que não descansarei enquanto não te matar! (Prisão?! Não, alego auto-defesa, nenhum júri me condenará nessa situação)
- todos os restantes, aluguem um autocarro e ponham-se a andar;

Que fique bem claro para todos, este é o meu ultimo postal, até nunca mais!

Vão embora!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

segunda-feira, 8 de agosto de 2011


Botão, fui de férias.
Estou a gostar muito de estar em camisa às riscas. Aluguei o terceiro botão a contar do colarinho e a vista daqui é de puro algodão.
Nas férias passadas tinha ficado no punho do lado esquerdo e aquilo foi de bainha descosida à nódoa tal eram as náuseas devido aos balanços. Assim, pelo menos, este ano não corro o risco de vomitar um desabotoamento.
Espero regressar antes dos dias frios começarem aí em camisa de flanela. Até lá, mexe-me esses dois buraquinhos e vê se tiras o borboto do quintal do caseado.
Mas fica aqui prometido, vou levar-te como prenda uma linha nova para deixares de ameaçar esse suicídio frouxo. Palavra de Casa.

Muitos abotoos e até breve.
umbigo de "Há dois egos atrás"

Buuuuuuuuuu,

Antes de qualquer conversa devo dizer-te que te prefiro de cabelo e unhas arranjadas. Gosto quando gostas de ti, quando lavas a cara com água fria e as mãos com cheiro alfazema. Gosto das sardas na cara, do sinal no braço e dos dentes ligeiramente abertos na frente. Quero que sejas tu, queres-me?

Ainda não o conheces, vai cair-te aos pés pelo odor corporal e sorriso escondido. Nove meses antes de mim faz amor no terraço porque lá o tecto muda todos os dias e a luz é suficiente para que ele te veja os olhos e a silhueta do pescoço. Não o vais amar, nem vais ser feliz ao seu lado. Amas-me? Eu amo-te em cada riso gengival.

Peço-te desculpa pelos enjoos matinais, a pressão sobre a bexiga, o parto difícil e o facto de teimar em não dar a volta completa. Quero nascer por onde foste fecundada, mas herdei a elasticidade do pai e a preguiça do tio.

Ah! De noite quero ovos estrelados, salsicha, feijão e batido de banana.

Devo no entanto dizer-te que a foto de barriga em fim de gestação que me enviaste do Japão em casa de Gueixa, tem nas costas 04/04/2014. Não gosto de dias certos. Subtrai um ano, soma três meses e multiplica 6 dias.

Quero ficar com o teu nariz, o dedo mindinho e os olhos negros (no dia 24/07/2013 deita-os ao meu lado, por favor).

Vou ser Gertrudes (não gosto de Zeferino) e não serei nem santa nem princesa, não serei feliz todos os dias e triste todas as noites, não serei especial nem diferente excepto aos olhos que deitas a meu lado.

Gugu dada bilu bilu brrrrrrrr,

Feto por fecundar


PS: Dás-me um beijo na nuca?

O tempo passou por nós, não vês?

Crescemos, tornámo-nos tristes.

No fundo, crescemos.

Perdemos as brincadeiras,

Os sentimentos sem sentido.

Perdemos a inocência,

A leveza das palavras

Que teimámos tantas vezes

Em esconder.

Não existem culpados,

Mas sentimos no nosso corpo

O ardor dos cactos,

Quando as lágrimas,

Queimando o rosto,

Caem desamparadas no chão.

Não há súplica que ecoe

Nos tempos de vidro,

Nas noites de metal,

Que nos ferem o peito.

Venho para dizer-te,

Que já não tenho endereço,

Que já não tenho idade,

Que este já não é o corpo

Onde tantas vezes te escondias.


Paulo Eduardo Campos, in "Na serenidade dos rios que enlouquecem", Amores Perfeitos, 2005

Dentro de ti...



Mais do que o teu nome,
Tu és o que pensas.

Mais do que o teu corpo,
Tu és o que sentes.

Mais do que a cor da tua pele,
Tu és da cor da Luz.

Mais do que homem ou mulher,
Tu és consciência.

Mais do que aquilo que sabes,
Tu és bem mais do que supões.

Mais do que os teus sonhos te dizem,
Tu és uma centelha do Universo.

Mais do que um acidente da natureza,
Tu és filho de um Grande Amor.

Mais do que os teus ouvidos ouvem,
Tu podes ouvir a voz do teu coração.

Mais do que os teus olhos vêem,
Tu podes ver além, em Espírito e Verdade.

Mais do que a distância que nos separa,
É aqui que os nossos corações se encontram.

Mais do que sabemos,
Somos eternos aprendizes do Todo.

Mais do que nossas palavras,
O Amor!

Mais do que tudo,
O Todo acima de nós!

Mais do que apenas palavras,
Paz e Amor!

Mais do que imaginamos,
Ferias dentro de ti...

domingo, 7 de agosto de 2011


Não dava para adiar mais. Este ano tive de passar as férias dentro da minha mente a fazer limpezas.

Os sonhos estavam dispersos pelas mesas, amontoados em pilhas, com páginas dobradas, cheios de anotações e capítulos rasgados. Sacudi-os, alisei-os e arrumei-os na estante com uma precisão de bibliotecária.

As paixões estavam abertas e expostas, a espalhar cheiros doces pelo ar. Decidi enrolá-las em película transparente e colocá-las no frigorífico. Sei que se alteram quando refrigeradas mas cá fora tornam-se demasiado maduras e intensas, antes de se cobrirem de bolores e leveduras.

As ideias lógicas não deram trabalho. Estavam onde as deixei, arrumadas em gavetas com raminhos de alfazema e pouco uso. Enxaguei-as com limão para tirar algumas nódoas difíceis e arejei-as um pouco.

A maior parte dos dias passei-os à volta da imaginação e da intuição. Derretem-se, pingam por todo o lado e ficam incrustadas. Nunca consigo retirá-las na totalidade e acabo sempre com grandes bocados a entupir-me o pensamento. Às vezes acho que devia aprender a passá-las por goma, prensá-las a ferro quente e guardá-las no contador. Mas desisto logo da ideia.

Depois de limpar tudo olhei mais uma vez para a porta ao fundo da minha consciência. Aquela que dá para uma divisão onde nunca acendo a luz e para onde atiro, de qualquer maneira, os medos, os impulsos, os desejos mais disformes, as obsessões, as paranóias, as alucinações.... E mais uma vez deixei-a fechada, temendo sempre o dia em a fechadura ceda à pressão do outro lado.

E pronto, ficou tudo mais ou menos limpo. Agora vou aproveitar e dar uma mangueirada à zona do coração. Anda a bombear demasiado sangue e a salpicar tudo à volta.


Imagem: Ballon Lamp, de Kouichi Okamoto

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Postal de Férias


Querido Amor,


Estamos os dois a precisar deste tempo, de dar espaço e movimento ao doce tormento que nos prende em plácida ditadura pintada de harmoniosa candura


E não foras tu o reverso do meu ser, a condicionante maior da energia que me faz mover por entre os sonhos e desejos do quotidiano, dar-te-ia a ti, querido Amor, toda uma dimensão nova de querer, de te querer dar e tanto receber


De outros véus por onde não me vês, entre sombras de luz em que te escondes, perversa inocência perdida entre desejos profundos e enlaces ternos, mornos e consentidos


Entre pensamentos que vogam em ondas de suspiro e espuma de romance, dentro de ti para sempre na quietude do instante que mergulha na angústia da delícia que haveria de vir e nunca chega, mesmo quando matinal se desenrola em teu espírito delicado


O clamor da violência não é para ti, querido Amor, a dormência dos sentidos, os corpos nus e desconhecidos, a agudez desta dor que nos faz gemer, o rasgar da pele que desvenda novos terminais nervosos, o profanar de teu corpo de suaves contornos, o viver em delito e deleite, não são coisas do Amor, oh não, são minhas e delas serei dono e senhor


Por isso, meu querido Amor, de ti fugi entre horas vagas e dias a coberto, entre o fulgir das areias deste desejo deserto e no rugir das ondas que se abatem sobre as rochas da nossa paixão


Sempre teu, ausente por momentos mas contigo emersa em negro coração,
Até breve e que breve seja a viagem entre dias que nos apartam,

Luxúria

Impossibilidades

É onde a cabeça de uma sweet little sixteen cai, frequentemente. Rola, desespero abaixo e, pum, estilhaça-se no vazio. Foge, acelerada, do...